Nota Pública ABRASME
60 anos da ditadura civil-militar de 1964: Em defesa da Memória, Justiça e Reparação!
”A Associação Brasileira de Saúde Mental – Abrasme — nesta data de 1 de abril de 2024 vem se manifestar quanto aos 60 anos de início da ditadura civil-militar que se instalou, perdurando por 21 anos e tendo seus reflexos ainda hoje sentidos na organização social e política do país.
Ao exigir que a memória, a justiça e a reparação às vítimas, aos familiares e amigos e em última instância à sociedade seja implementadas, a Abrasme se agrega ao pensamento e escritos de pesquisadores e diversos atores do movimento social que apontam a transição inacabada como um ponto chave na vida política brasileira.
A transição inacabada perpetua diversas formas de violência de Estado e impede que as vítimas e familiares deste período obscuro tenham, através do desnude de uma verdade histórica e pessoal, um efetivo reconhecimento das atrocidades realizadas pelo Estado brasileiro contra aqueles que ousaram lutar contra um regime de exceção.
A Comissão Nacional da Verdade e as comissões estaduais em seus relatórios lograram jogar luz sobre muitos dos crimes cometidos e reconstruir, através de milhares de depoimentos, uma história que por décadas os setores que conspiram contra a democracia tentam silenciar.
Não é novidade que ao longo dos séculos, desde a colonização do país, o Brasil tem como marca uma história contada por seus algozes.
Os muitos genocídios dos povos originários, os apagamentos e distorções de levantes contra a opressão, uma escravidão cuja abolição é forjada em um gabinete e nunca foi de fato implementada através da justiça feita aos libertos. E, ainda, uma república permeada por um militarismo associado à elite capitalista que assombra a sociedade através de uma suposta crença em um poder moderador.
Esses fatos e forças buscam a manutenção de um status quo de um poder exercido por poucos e que perpetua a desigualdade social e a vulnerabilização de hordas de brasileiros.
Em suas diversas metamorfoses, essas forças se disfarçam em supostas “reformas democráticas” de defesa do Estado, reproduzindo a violência e a opressão, como constatado na ditadura civil-militar (ironicamente denominada revolução por seus autores), e que hoje completa 60 anos no obscurantismo oficial.
No entanto, podemos dizer que a luta dos que vieram antes continua reproduzindo gritos de liberdade.
A Abrasme tem a clareza de que uma luta por uma sociedade sem manicômios não se restringe à atuação setorial, pois os manicômios são simbolicamente todos os espaços de cerceamento, violação de direitos e silenciamento da diversidade — seja na luta política, seja na garantia das diversas expressões do ser e das formas singulares de existência.
Desta forma, compreendemos os avanços das últimas décadas através de uma permanente disputa de campos, liderados pelos movimentos organizados da sociedade civil.
Infelizmente, ainda nos deparamos com uma luta contra-hegemônica pela afirmação da justiça social, memória e reparação, fundamentais para a construção de um estado onde a violência seja substituída pela proteção de seus cidadãos de forma igualitária e equânime.
Proteção através da qual não se tenha entre as principais vítimas de morte violenta jovens negros ou pardos das periferias, onde não sejamos o 4º país que mais mata ativistas de direitos humanos no mundo, onde não sejamos o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ nas Américas ou que mais mata pessoas transsexuais no mundo.
Esta é a marca da violência que se origina na truculência das forças de segurança do Estado e seus apoios por uma elite conservadora. Apoio pela ação ou pela omissão.
Hoje, temos ainda em curso a condenação das lideranças e financiadores da tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023. Os seus agentes não podem ser anistiados, como circula nos bastidores do parlamento a articulação de deputados que perpetuam a face truculenta da sociedade.
Acreditamos que neste primeiro de abril, mais de meio século após a última ruptura da democracia no país, é fundamental que as vozes da liberdade sejam ouvidas, os protestos de ativistas e vítimas ecoem alto e forte, apesar do silêncio imposto sob a justificativa de estabilidade democrática.
Desta forma, a Abrasme traz seu posicionamento e, dentre tantas outras formas também necessárias de “memória, justiça e reparação”, exige:
1. A imediata reinstalação da comissão especial sobre mortos e desaparecidos políticos — CEIMP — criada em 1995 e desmobilizada durante o governo Bolsonaro.
2. O desarquivamento do processo do Ministério Público Federal contra os militares que, em janeiro de 1971, assassinaram Rubens Beyrodt Paiva (ex-deputado federal cassado em 1964) nas dependências do Doi-Codi, na Rua Barão de Mesquita.
Entendermos que o crime de tortura se inscreve no rol de crimes de lesa-humanidade, por isso não prescreve e/ou pode ser anistiado por qualquer forma legislativa.
3. A criação de uma Comissão Nacional da Verdade dos povos indígenas para apuração específica das violações acontecidas durante a ditadura contra estes.
4. Apuração e condenação, sem anistia, dos agentes da tentativa de golpe contra o Estado Brasileiro em 8 de janeiro de 2023.
Vários estados, 01 de abril de 2024.
Associação Brasileira de Saúde Mental – Abrasme”
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